quinta-feira, 16 de agosto de 2012

O Abiku

Àbíkú (nascer-morrer)

Só mesmo um grande mestre como Pierre Verger para nos tirar da ignorância sobre este tema, através da sua pesquisa e coragem, cujo legado será eterno.

Se uma mulher, em país yorubá dá à luz uma série de crianças natimortas ou mortas em baixa idade, a tradição reza que não se trata da vinda ao mundo de várias crianças diferentes, mas de diversas aparições do mesmo ser (para eles, maléfico) chamado àbíkú (nascer-morrer) que se julga vir ao mundo por um breve momento para voltar ao país dos mortos, órun (o céu), várias vezes.

Ele passa assim seu tempo a ir e voltar do céu para o mundo sem jamais permanecer aqui por muito tempo, para grande desespero de seus pais, desejos de ter os filhos vivos.

Encontramos informações a respeito dos abikú em oito itans (histórias) de ifá, sistema de adivinhação doa yorubá, classificados nos 256 odu (sinais de ifá). Essas histórias mostram que os abikú formam sociedades no egbá órun (céu), presididas por iyàjansà (a mãe-se-bate-e-corre) para os meninos e olókó (chefe da reunião) para as meninas, mas é Aláwaiyé (Rei de Awaiyé) que as levou ao mundo pela 1ª vez na sua cidade de Awayié. Lá se encontra a floresta sagrada dos abikú, aonde os pais de abikú vão fazer oferendas para que eles fiquem no mundo.

Quando eles vem do céu para a terra, os abikú passam os limites do céu diante do guardião da porta, oníbodé órun, seus companheiros vão com ele até o local onde eles se dizem até logo. Os que partem declaram o tempo que vão ficar no mundo e o que farão. Se prometem a seus companheiros que não ficarão ausentes, essas, crianças apesar de todo os esforços de seus pais, retornarão, para encontrar seus amigos no céu.

Nossas histórias de ifá nos dizem que oferendas feitas com conhecimento de causa são capazes de reter no mundo esses abikú e de lhes fazer esquecer suas promessas de volta, rompendo assim o ciclo de suas idas e vindas constantes entre o céu e a terra, porque, uma vez que o tempo marcado para a volta já tenha passado, seus companheiros se arriscam a perder o poder sobre eles.


Entre as oferendas que os retêm aqui, na terra, figuram, em primeiro plano, as plantas litúrgicas.
- Abíríkolo (crotalaria lachnophera, papilolionacaae)
- Agídímagbayin (não identificada)
- Ídí (terminalia ivorensis, combretacae)
- Ijá àgborin (não identificada)
- Lara pupa (ricinus communis - mamona vermelha)

Ainda mais duas plantas são frequentemente utilizadas para reter os abikú e que não figuram nessas histórias:
- Olobutoje (jatropha curcas, euphorbiaceae)
- Òpá eméré (waltheria americana, sterculiaceae)

A oferta dessas folhas constitui uma espécie de mensagem e é acompanhada por ofó (encantamentos).

Em país yorubá, os pais, para proteger seus filhos abikú e tentar retê-los no mundo, podem se dedicar a certas práticas, tais como fazer pequenas incisões nas juntas da criança e aí esfregar atin (um pó preto feito com ossum, favas e folhas litúrgicas para esse fim) ou ainda ligar à cintura da criança um ondè, talismã feito desse mesmo pó negro, contido num saquinho de couro.

A ação protetora buscada nas folhas, expressa nas fórmulas de encantamento, é introduzida no corpo da criança por pequenas incisões e fricções, e a parte do pó preto, contida no saquinho do ondé, representa uma mensagem não verbal, uma espécie de apoio material e permanente da mensagem dirigida pelos elementos protetores contra os elementos hostis, sendo essa forma de expressão menos efêmera do que a palavra.

Em uma outra história, são feitas alusões aos xaorôs, anéis providos de guizos, usados nos tornozelos pelas crianças abikú , para afastar os companheiros que tentam vir buscá-los no mundo e lembrar-lhes suas promessas. De fato seus companheiros não aceitam assim tão facilmente a falta de palavra dos abikú, retidos no mundo pelas oferendas, encantamentos e talismãs preparados pelos pais, de acordo com o conselho dos babalaôs. Nem sempre essas precauções e oferendas são suficientes para reter as crianças abikú sobre a terra. Iyájanjàsa é muitas vezes mais forte. Ela não deixa agir o que as pessoas fazem para os reter e porá tudo a perder o que as pessoas tiverem preparado. Contra os abikú não há remédios. Yiájanjàsá os atrairá à força para o céu. Os corpos dos abikú que morrem assim, são frequentemente mutilados. A fim de que, dizem, eles percam seus atrativos e seus companheiros no céu não queiram brincar com eles sobretudo para que o espírito do abikú, maltratado deste modo, não deseje mais vir ao mundo.

Essas criança abikú recebem no seu nascimento, nomes particulares. Alguns desses nomes são acompanhados de saudações tradicionais. Eles podem ser classificados: quer nomes que estabeleçam sua condição de abikú; quer nomes que lhes aconselham ou lhe suplicam que permaneçam no mundo; quer em indicações de que as condições para que o abikú volte não são favoráveis; quer em promessas de bom tratamento, caso eles fiquem no mundo. A frequência com que se encontra, em país yorubá, esses nomes em adultos ou velhinhos que gozam de boa saúde, mostra que muitos abikú ficam no mundo graças, pensam as almas piedosas, a todas essas precauções, à ação de Òrúnmìlà, e à intervenção dos babalaôs.

Alguns nomes dados aos ABIKÚ:

Aiyédùn - a vida é doce
Aiyélagbe - Nós ficamos no mundo
Akúji - O que está morto, desperta
Bánjókó - Senta-se comigo
Dúrójaiyé - Fica para gozar a vida
Dúróoríìke - Fica, tu serás mimada
Èbèlokú - Suplica para que fique
Ilètán - A terra acabou (não há mais terra para enterra-lo)
Kòjékú - Não consinta em morrer
Kòkúmó - não morra mais
Kúmápáyìí - A morte não leva este daqui
Omotúndé - A criança voltou
Tìjúikú - Envergonhado da morte (não deixa a morte te matar)

As cerimônias para os abikú parecem ser pouco frequentes entre os yorubás, a única assistida por Pierre Verger, a cerimônia foi feita pela tanyinnon encarregada do culto aos deuses protetores de uma família tradicional do bairro Houéta. Num canto da peça principal, oito estatuetas de madeira com 20 centímetros de altura e eram colocadas sobre uma banqueta de barro.

Todos vestidos de panos da mesma qualidade, mostrando pela uniformidade de suas vestimentas, pertencer a uma mesma sociedade (egbé). Seis destas estatuetas representam ábíkús e as outras duas ibeji. As oferendas consistiam de oká (pasta de inhame) obèlá (espécie de caruru) èkuru (feijão moído e cozido nas folhas) eran dindi, eja dindin (carne e peixe fritos) que, depois da prece da tanyionnon e da oferenda de parte desta comida às estatuetas, foram distribuídas pela assistência. Uma sacerdotisa de Obatalá assistiu à cerimônia sublinhando as ligações que existem entre o orixá da criação, as pessoas de corpos mal formados, corcundas, alijados, albinos e aqueles cujo nascimento é anormal (àbíkú e ibeji).

Portanto ao contrário que muitos falam, nada tem a ver com a criança que já nasce "feita" no santo.


O legado dos antigos pelas suas crenças, histórias e ritos da sua prática religiosa e cultural, se adaptam e se aplicam em qualquer tempo, através da sua sabedoria, com muita propriedade.

Em seu tempo, não há referências ao aborto, mas ao contrário, o esforço pela manutenção da vida, inclusive em quantidade. Pela prática divinatória através do jogo de búzios, nos dias de hoje identificamos muitos desses abikús , que percebemos em uma segunda instância, muitos são "criados", passam a existir por ingerência do ser humano através do aborto, é até simples de entender e ver por uma ótica e lógica astral/espiritual a qual simplesmente não podemos deletá-la da nossa mente e inteligência, ou na pior das hipóteses; ignorá-la: No instante em que o óvulo é fecundado pelo espermatozóide, esta nova matéria existente já é provida de alma e espírito, que os cristãos chamam de "anjo da guarda" e os yorubanos de "orixá" (guardião da cabeça), este fenômeno consta na teologia Yorubana.

Quando da execução do aborto propriamente dito, o ser humano supostamente, exerce o "seu direito" de eliminar aquele ser; mas somente a parte material, o corpo, por ele criado através do ato sexual de procriação, matando de forma definitiva o feto. Mas e o que por ele não foi criado, alma e espírito, onde fica, para onde vai? Esta análise via de regra não é feita ou levada em consideração, acaso haverá consequencias? Seríssimas, que aqui descrevemos com muita convicção, pautado nas mais diversas constatações através dos consulentes, por mais de duas décadas, dos sintomas pós aborto, a presença daquela "figura" que aparece de uma forma genética, oriunda de gerações passadas, os que são provocados e voltam ainda na mesma geração, e os que voltarão em nossos descendentes, e da forma mais imprevisível possível. A grande maioria de seres que nascem com deformidades, doenças graves, mortes prematuras... tem grandes possibilidades de serem abikús fabricados pelo homem.

Nos dias de hoje, quando morre uma criança ainda nova, há muita possibilidade de ser um abikú que está voltando ao "céu", bem como persiste a probabilidade de voltar em um próximo filho, ainda na mesma geração ou na próxima; quando uma criança fica muito doente e corre risco de vida, pode averiguar na família se já há caso de aborto ou morte prematura, é bem possível.

As reações, mais da mãe que do pai, em caso de aborto, porque muitas vezes o pai não fica sabendo e não participa da decisão, na sua vida, no seu dia a dia são sintomáticas: desequilíbrio generalizado, na vida pessoal, no trabalho, em casa, nos estudos, nada dá certo, nada vai bem, angustia, depressão, pessimismo, falta de ânimo, aparentemente tudo deveria estar bem, mas as coisas não "vão"; É a influência daquele "ser", que contrariando as leis da natureza foi "fisicamente" eliminado, o qual fica gravitando num outro plano próximo aos pais, afetando suas vidas com estes sintomas.

Até mesmo por uma questão de justiça, não poderá um abikú que foi "gerado" por uma família, aparecer em outra, que nada tem a ver com o ato irresponsável de outros, e percebemos que uma criança que já nasce deformada de alguma forma, ou uma doença grave com morte, quem sofre realmente na sua plenitude são os pais, porque a dor interna é maior que a dor física, a criança já nasceu daquela forma, para ela que não sentiu e não sabe ser saudável, não percebe e não imagina como se sente alguém normal, portanto a sua dor ou problemas, para si é normal.

Esta situação pode e deve ser tratada no seu campo espiritual, os antigos nos legaram instrumentos dentro da religião yorubá, para fazê-lo, através de ebós e oferendas específicas, que se vale do mesmo princípio aplicado nos países yorubanos, quer seja: "enganar" os abikús; Muito se pode melhorar e modificar, evidente que em alguns casos é irreversível após o nascimento, mas se detectado ou informado o babalorixá ou yialorixá competente, pelo que foi descrito, a mãe que poderia vir a ter um filho abikú, por meio desses ebós e oferendas pode-se evitar a vinda de um ser deformado ou com problemas sérios, que na realidade, nada mais é que um "retorno sob forma de castigo" de atos nossos ou de gerações passadas, de um processo que nunca foi tratado ou interrompido.

Desta forma vê-se que o aborto é uma situação que transcende a ingerência das pessoas, pois é algo ligado diretamente à natureza, e consequentemente ao Seu Criador, modifica-se ou escapa da lei dos homens, mas não à Divina. Este é um fato porque nenhuma religião da terra permite o aborto.

(O Candomblé)



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